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sábado, 19 de fevereiro de 2011

Análise da Prova da OAB 2010.3

Caros amigos,

Após a aplicação de mais uma Prova da OAB é possível apontar alguns indicativos acerca do perfil da FGV na qualidade de organizadora do certame. Particularmente, acredito que duas características marcam o estilo da Fundação ao elaborar a prova: (1) a cobrança - como já havia sido destacado em postagens anteriores - do texto da própria Constituição; (2) a exigência eventual de casos concretos que contemplem o raciocínio do examinando.

Sendo assim, analisemos os temas cobrados na Prova (Tipo 1, Branco, que pode ser encontrada aqui):

Questão 28: Controle de Constitucionalidade (Gabarito: Letra C)

Trata-se de caso concreto envolvendo controle concentrado e buscando saber do aluno qual seria a ação cabível a ser ajuizada pelo Governador de Estado. O ponto crucial da questão está em saber qual a ação cabível no caso de legislação anterior à Constituição perante ela questionada. Levando-se em conta jurisprudência antiga do Supremo a propósito do caso, é cabível a propositura de arguição de descumprimento de preceito fundamental, dada a inviabilidade do ajuizamento de ADI, e em homenagem ao princípio da subsidiariedade. O mais importante seria conhecer o entendimento do Supremo de que não é possível, no controle concentrado, ajuizar ADI contra o direito anterior à Constituição, tornando possível, apenas, a propositura da ADPF. Única questão da prova que exigia o conhecimento da jurisprudência do STF, estabelecida desde o julgamento da ADI 2, Rel. Min. Paulo Brossard (quem tiver curiosidade pode aprofundar o tema clicando aqui).

Questão 29: Fiscalização Orçamentária (Gabarito: Letra D)

A questão envolve o conhecimento da literalidade do texto da Constituição, levando-se em conta, em um primeiro momento, a redação abrangente trazida pelo parágrafo único do artigo 70 da Carta Magna. O ponto essencial reside na viabilidade de o Tribunal de Contas da União proceder à fiscalização financeira e orçamentária de qualquer pessoa - seja ela física ou jurídica, pública ou privada - que lide com o dinheiro público, o que contempla o repasse de verbas por parte da União para os demais Entes Federados. Ademais, a alternativa correta pode ser encontrada expressamente no inciso VI do artigo 71 da CF/88.

Questão 30: Administração Pública (Gabarito: Letra A)

Questão não tão usual em Prova de Constitucional, sendo mais aguardada na Prova de Administrativo. Deve-se levar em consideração a redação do artigo 37 da Constituição. Alguns detalhes podem ter induzido candidatos a erro. A alternativa D menciona, por exemplo, que o direito de greve seria exercido nos termos de lei complementar, quando o correto seria mencionar lei específica (art. 37, inciso VII). A alternativa B menciona a possibilidade de aplicar a cassação de direitos políticos no caso de condenação por improbidade administrativa, o que não pode ocorrer, sendo possível, em verdade, a aplicação de suspensão dos direitos políticos (art. 37, §4º). A letra C contraria o exposto pelo artigo 37, inciso XIII, do Texto da Carta Magna, tendo em vista ser vedada qualquer equiparação das espécies remuneratórias de pessoal do serviço público. Logo, temos como gabarito a letra A, que corresponde, exatamente, ao texto do artigo 37, inciso V, da Constituição.

Questão 31: Lei Complementar (Gabarito: Letra C)

Questão que exige a memória do candidato no sentido de recordar alguma matéria específica da Constituição que exija a regulamentação via Lei Complementar. Vale ressaltar que a "contratação por tempo determinado na administração pública" (artigo 37, inciso IX), "as formas de participação do usuário na administração pública" (artigo 37, §3º) e "o estatuto jurídico das empresas públicas e sociedades de economia mista" (artigo 173, §1º) permitem, em sua regulamentação, a expedição de lei ordinária, restando a lei complementar como a espécie normativa cabível no caso do gabarito da questão, contemplando o texto do artigo 163, inciso I, da CF/88.

Questão 32: Medidas Provisórias (Gabarito: Letra D)

Questão que exige o conhecimento do artigo 62 da Constituição, e mais especificamente do seu §1º. Analisando as alternativas dispostas, percebe-se que a única hipótese em que é vedado o uso de medida provisória encontra-se disposta na letra D, contemplando partidos políticos e direito eleitoral.

Questão 33: CNJ (Gabarito: Letra C)

Exige o conhecimento, mais uma vez, do Texto Constitucional, particularmente do seu artigo 103-B. A frase mencionada na questão está praticamente correta, salvo no que tange à função de julgamento. Como veio a ser decidido recentemente pelo STF, a questão pode ser resolvida mediante a lembrança, pelo candidato, de que o CNJ integra o Poder Judiciário, embora não exerça função jurisdicional. Logo, ele não tem competência para julgar magistrados, conduzindo à marcação da letra C como gabarito.

Questão 34: Processo Legislativo (Gabarito: Letra D)

Deve-se lembrar que o Chefe do Poder Executivo exerce a Chefia da Administração Pública, sendo de sua iniciativa projetos que tenham por objetivo aumentar a remuneração de servidores. Por exemplo, no âmbito da Administração Pública Federal, temos a figura do Presidente da República como a pessoa competente para apresentar Projetos em tal âmbito, nos termos do 61, §1º, da CF/88. Ocorre o mesmo raciocínio na órbita estadual, realizando-se as alterações necessárias de acordo com o chamado princípio da simetria. Sendo assim, não se permite iniciativa parlamentar no caso, sendo que o Projeto citado deveria ter sido proposto pelo próprio Governador de Estado, por se tratar de matéria de sua iniciativa, caracterizando a letra D como gabarito.

Questão 35: Direitos Fundamentais (Gabarito: Letra D)

Mostra-se imprescindível, para responder à questão, o conhecimento do famoso artigo 5º da Constituição, sendo que o tema da questão diz respeito à liberdade de associação para fins lícitos.  Mais uma vez vale a recomendação que sempre faço em sala para os candidatos no sentido de ser imprescindível conhecer bem o texto do artigo 5º, sempre cobrado em prova. No caso, deve-se lembrar ser livre a criação de qualquer associação, sendo possível, contudo, que ordem judicial leve à sua suspensão (art. 5º, inciso XIX), consoante preceitua a letra D.

Questão 36: Direitos Políticos (Gabarito: Letra D)

A questão demanda o conhecimento do artigo 14 da Constituição, assim como uma interpretação cuidadosa do próprio sentido do texto. Ela menciona serem inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos (artigo 14, §4º). São inalistáveis, por sua vez, os estrangeiros e os conscritos durante o período do serviço militar obrigatório (artigo 14, §2º). Deve-se saber, então, aqueles que são, simultaneamente, inalistáveis e inelegíveis, tornando correto o gabarito da letra D, a única que faz referência aos estrangeiros e conscritos.

Questão 37: Competências (Gabarito: Letra C)

A questão exige uma leitura atenta, por parte do candidato, do conteúdo das competências do STF e STJ. Deve-se lembrar, primeiramente, ser de competência da Justiça Federal de primeira instância o processamento e julgamento de crime político (artigo 109, inciso IV). Ocorre que o recurso da aludida decisão tem por Tribunal competente o STF, como determina o artigo 102, inciso II, alínea b, da Constituição. Ademais, vale lembrar que processos instaurados por Estado estrangeiro contra pessoa residente no Brasil - que são de competência, em primeiro grau, também dos Juízes Federais, nos termos do artigo 109, inciso II, da CF/88 - têm como instância recursal o STJ, nos termos do artigo 105, inciso II, alínea c, da Constituição. Sendo assim, tem-se como gabarito a letra C.

Achei a prova bem elaborada, exigindo assuntos tradicionais mesclados a temas não tão comuns em Provas de Constitucional. Fica como sugestão para futuros candidatos a reiteração do conselho anteriormente mencionado aqui no blog: é imprescindível reforçar a necessidade de leitura do Texto Constitucional, que foi cobrado como critério essencial para responder a 09 das 10 questões da Prova. Além da leitura direta do Texto, há quem prefira ouvir a Constituição, sendo possível, inclusive, encontrar o link para o arquivo disponibilizado pelo site da Câmara dos Deputados em postagem anterior aqui do blog.

4 comentários:

  1. Caro Professor Gabriel, é possível reajustar salário mínimo mediante Decreto do Executivo, ou trata-se de competência do Poder Legislativo? Essa competência seria ou não delegável ao Poder Executivo? Gostaria de saber o seu pensamento a respeito, se lhe for a pergunta pertinente.

    A seguir, uma notícia que reporta o interesse da OAB em propor ADI contra potencial lei ordinária que prevê admissão de reajuste de salário mínimo por decreto do Presidente da República:

    http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/oab+pode+ingressar+com+acao+no+stf+contra+minimo+fixado+por+decreto/n1238106029272.html

    Atenciosamente,
    domguedes@gmail.com

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  2. Prezado Domingos,

    A ADI por você mencionada já foi, de fato, ajuizada por alguns partidos políticos, como você pode encontrar no link abaixo:

    http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=173205

    Particularmente, não creio ser inconstitucional a fixação, tendo em vista o fato de que o Decreto do Executivo apenas detalha os procedimentos relativos ao valor do salário, encontrando autorização para tanto no disposto pelo artigo 3º da Lei nº 12.382/2011.

    Abraço!

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  3. Eu não acho o nível das provas da FGV alto, porém não acho tão baixo quanto o da FCC.

    É mesmo um caso de atenção para não cair numa pegadinha do tipo "cassação/suspensão".

    Nós dois já tivemos oportunidade de analisar uma possibilidade, graças a um pouco de atenção da sua parte, sobre recurso da prova de constitucional da 2ª fase. E também não achei pesado, ao que me lembro fazia uma pegadinha com algum remédio constitucional...

    O comentário objetivo das questões que você expôs tornou a leitura tranquila... Valeu Gabriel!

    Forte abraço

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  4. Caro Tiago,

    Primeiramente, fico contente com sua presença também por aqui! Volte sempre que desejar, meu amigo! :)

    Como mencionei anteriormente, são duas as tendências notadas na prova da FGV: (1) cobrança do texto literal da Constituição; (2) cobrança eventual de casos concretos para treinar o raciocínio do candidato. Particularmente acho a prova mais elaborada do que a da FCC também...a grande recomendação é conhecer, antes de tudo, o texto da Constituição, o que pode ser feito consultando o site do planalto (www.planalto.gov.br), assim como o tópico "A Constituição em áudio", disponível no site da Câmara dos Deputados e também aqui no blog.

    No mais, abraço grande!

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